Repouso mínimo, a poesia
Sirvo-me uma ótima bebida
Azeitonas de tira gosto
Quanto menos contemos os impulsos, mais animalescos e deliciosos parecem ser nossos prazeres.
Eu bem quis enfiar um monte de azeitona na boca e me embriagar de excesso
Mas tinha caroço.
De certo, morreria engasgado
Comecei a ser lembrado
Do que me trouxe até aqui
Eu pedi tanto ao meu corpo:
- Corpo, não me trai
Se mantém firme
não decai
Que eu nunca precisei tanto de ti, corpo.
Eis que de repente, na eminência de perder tudo
Lanço-me com todo o vigor que me resta, não muito,
Pra pegar o penúltimo ônibus que saiu de meu terminal.
Meu corpo não chega. Perco
Tornozelo lateja. Percebo
- Não me trai, corpo
Ainda tem muito chão pra azeitona
Tanto pra carregar
Aguenta mais um pouco
Bem sei
Não te bonifiquei com repouso merecido
Bem sei
Eu te neguei o gozo requerido
Bem sei
Mas não me trai, corpo
Desço na avenida
Passo por uma favela
Linda de ver naquela hora.
Do portão, a mulher de camisola se esgueira a atrás do portão
Chamando alto a menina que jogava bola de gude descalça no chão de barro.
- Açucena!
A menina fingiu não ouvir até onde pôde
Entre muxoxos e resmungos, a mulher grita pra menina
Pra que a menina corresse até a esquina pra chamar Paloma.
Paloma aparece na varanda, que é puxadinho de outra casa,
E fala o mais alto que pode:
- tá. peraê. Tô indo
O limite estético da mulher não querer sair do portão
O limite jovial da menina não querer perder seu cocão
O limite adolescente que Paloma não queria ter
O limite do corpo que eu não queria ser
Magicamente, o tornozelo não dói mais
Brevemente, olho pra trás
Percebo que foi viver em meus limites
Que me fez achar as matrizes
De ser um trombadinha intelectual
Um garanhão mal amado
Tradutor mal interpretado
Comilão magro
Delícia de louco
Um anjo torto
... que gosta de azeitona com caroço
Porque reteve o gosto divino dos limites e acompanha vigilância.
Está nascendo um novo líder.
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